quinta-feira, 10 de dezembro de 2009

A desconstrução do "Secularismo como fundamento da democracia"

Um dos seguidores do blog enviou este e-mail, com o texto abaixo, desconstruindo a postagem do dia 05/12/2009. O leitor Marcus Santana, com percuciência, erudição e lucidez, soube rebater os argumentos e estabelecer um excelente díscurso sobre a democracia e a religião, de modo que é obrigação publicar aqui a sua mensagem, pela justeza dos argumentos esgrimidos e pelo amor ao debate democrático. Segue, sem cortes:

"Puxa, mal posso crer que os EUA ainda estejam perplexos ante uma discussão há tanto tempo superada.


Pelo menos no âmbito da doutrina católica, da qual comungo, não há dúvida de que Fé e Razão são e devem ser sempre parceiras para se aceder ao conhecimento da verdade.

O Catecismo da Igreja Católica - CIC -, por exemplo, orienta expressamente o seguinte no item 159:

"(...) o mesmo Deus, que revela os mistérios e comunica a fé, também acendeu no espírito humano a luz da razão. E Deus não pode negar-Se a Si próprio, nem a verdade pode jamais contradizer a verdade"(cf. I Concílio Vaticano, Const. dogm. Dei Filius, c. 4: DS 3017).

"É por isso que a busca metódica, em todos os domínios do saber, se for conduzida de modo verdadeiramente científico e segundo as normas da moral, jamais estará em oposição à fé: as realidades profanas e as da fé encontram a sua origem num só e mesmo Deus. Mais ainda: aquele que se esforça, com perseverança e humildade, por penetrar no segredo das coisas, é como que conduzido pela mão de Deus, que sustenta todos os seres e faz que eles sejam o que são, mesmo que não tenha consciência disso" (c.f.II Concílio Vaticano, Const. past. Gaudium et spes, 36: AAS 58 ((966) 1054.)

Caso alguém se interesse, pode buscar esses dados no endereço:

http://www.vatican.va/archive/cathechism_po/index_new/index-prima-parte_po.html

Também o Papa João Paulo II, em sua Carta Encíclica, Fides et Ratio (FeR), sobre a relação entre Fé e Razão, expôs com clareza como podem caminhar juntos esses dois sistemas próprios do ser humanos e possibilitar a sua harmonia no plano interior (pessoal) e exterior(social).

FeR n. 104. "O pensamento filosófico é frequentemente o único terreno comum de entendimento e diálogo com quem não partilha a nossa fé (...) Este terreno comum de entendimento e diálogo é ainda mais importante hoje, se se pensa que os problemas mais urgentes da humanidade — como, por exemplo, o problema ecológico, o problema da paz ou da convivência das raças e das culturas — podem ter solução à luz duma colaboração clara e honesta dos cristãos com os fiéis doutras religiões e com todos os que, mesmo não aderindo a qualquer crença religiosa, têm a peito a renovação da humanidade. Afirmou-o o Concílio Vaticano II: « Por nossa parte, o desejo de um tal diálogo, guiado apenas pelo amor pela verdade e com a necessária prudência, não exclui ninguém: nem aqueles que cultivam os altos valores do espírito humano, sem ainda conhecerem o seu Autor, nem aqueles que se opõem à Igreja e, de várias maneiras, a perseguem »."

Esse documento pode ser lido na íntegra no endereço seguinte:

http://www.vatican.va/holy_father/john_paul_ii/encyclicals/documents/hf_jp-ii_enc_15101998_fides-et-ratio_po.html

Com tudo isso, no presente contexto sócio-cultural e frente à nossa realidade, penso já não ser mais possível pensar uma Fé que não esteja purificada pela Razão, ou uma Razão que não esteja iluminada pela Fé.

Este diálogo entre Fé e Razão, quando existe, certamente colabora para a formação integral da pessoa humana, e abre horizontes para o diálogo com quaisquer pessoas, quer pela Fé, quer pela Razão.

Mas, com certeza, quando se pensa em uma Teocracia irracional, não se atende aos desejos de Deus, quando muito se atende aos desejos egoísticos dos espertalhões no poder. Não creio que Deus tome partido de qualquer regime político ou tome lado de qualquer bloco político partidário, mas creio que Deus quer o bem do ser humano que criou para si. E isso não ocorre em qualquer sistema que prive o ser humano do senso crítico e da abertura dialógica próprios da liberdade que está entre os mais valiosos bens cuidados pelo ser humano.

Assim, preciso elogiar o Barack Obama pela simplicidade com que tratou do tema, e preciso me estarrecer com o atraso da Sociedade Americana em ainda não ter compreendido que entre fé e razão não há dualismo(que se opõe), e sim uma dualidade (que se complementa).

Parabéns pelo Texto, Professor Israel.

Só faço uma crítica construtiva ao seu texto.

O secularismo não é fundamento da Democracia. Esse constitui-se apenas em uma expressão do modo de pensar e das crenças das pessoas, igualmente ao deísmo, gnosticismo, teísmo, etc. Assim, não é graças ao secularismo que se chega à Democracia, mas é na Democracia que o secularismo e outras correntes filosóficas ou religiosas podem tomar lugar, livremente. O Respeito e o Diálogo, sim, são fundamentos da Democracia.

Somente onde e quando estes estão presentes, independentemente de haver teísmo ou ateísmo a Liberdade e a Dignidade da Pessoa Humana podem ser tutelados. Se não houver o Respeito e o Diálogo, não poderá existir Democracia. O Estado Democrático deve se fundar nesses valores, portanto, mais do que no secularismo.

Até porque, o Princípio da Laicidade do Estado nos informa que o Estado deve ser laico. E isso é bem diferente de o Estado ser ateu. O Estado não pode se vincular a corrente religiosa alguma. Mas deve estar aberto à liberdade religiosa, e valorizar as manifestações religiososas-culturais de seu Povo. Não creio que a Democracia em que isso ocorre livremente possa ser considerada secular. É, sim,'governada pelo povo' (demo-crática), por ter o Respeito e do Diálogo como princípios.

Isso, é claro, tu sabes melhor que eu.

Apenas quis polemizar, não foi?

Pois bem, conseguiste!



Saudações de seu aprendiz.

Marcus Santana"

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